A Prática da Natação Após o Contágio pela Covid-19

 



(Escrito por Renato Coelho)


Cada descoberta pela ciência sobre a Covid-19 tem se tornado um importante passo para desvendar os mistérios e descobrir a dinâmica da ação do vírus no corpo humano. Não se sabe ao certo os efeitos e as consequências do vírus à longo prazo, já que a doença é muito recente, porém, as observações em pacientes que receberam alta dos hospitais, tem indicado sequelas importantes em decorrência da covid-19. Existem ainda muitas dúvidas sobre a influência dos exercícios físicos em pacientes já recuperados da Covid-19, mas muita coisa tem sido descoberta pela ciência neste curto espaço de tempo de pandemia sobre o tema relacionado a exercícios físicos e a covid-19.

No início da pandemia do novo coronavírus, que se deu durante o primeiro semestre de 2020, se sabia muito pouco sobre as manifestações e as sequelas da Covid-19, porém, várias das perguntas foram sendo respondidas após intensas pesquisas e também através das experiências acumuladas no tratamento de pacientes infectados nestes mais de dez (10) meses de pandemia. Sabe-se atualmente que a Covid-19 não é somente uma doença pulmonar, ela é capaz de provocar a chamada “tempestade inflamatória” no corpo dos pacientes, atingindo praticamente todos os órgãos e tecidos do corpo humano. A Covid-19 é na verdade uma doença sistêmica, capaz de atacar ao mesmo tempo todos os órgãos humanos, desde os pulmões, passando pelo coração, cérebro, pele, olhos, sistema nervoso, rins, sistema circulatório e etc, provocando dificuldades respiratórias, fibroses pulmonares, fraquezas, confusões mentais, perda da libido, tromboses e AVC.




Figura 01 - "Tempestade Inflamatória" provocada pela Covid-19

Um dos órgãos que mais sofre com os ataques do vírus Sars-Cov-2, além dos pulmões, é o coração. O vírus ataca os músculos cardíacos podendo provocar sérias lesões miocárdicas (miocardite), arritmias, palpitações, paradas cardíacas e até mortes súbitas em esportistas e em atletas. Todo o sistema circulatório também sofre influência do vírus com surgimento de coagulações sanguíneas (tromboses). Segundo estudos publicados pela Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE) em conjunto com a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) [1], mesmo pessoas que apresentaram quadros leves da doença, podem apresentar sérias alterações eletrocardigráficas mesmo setenta (70) dias após o diagnóstico da doença. A Covid-19, segundo o estudo apresentado, tem provocado complicações cardiovasculares em cerca de 16% dos pacientes, lesões cardíacas em 20-30% dos pacientes hospitalizados e contribuindo para 40% dos óbitos. Para aqueles indivíduos que durante a fase aguda da doença apresentaram miocardite e que já receberam alta, a recomendação médica é três meses de espera antes do retorno aos exercícios físicos ou treinamento, e a realização de exames médicos detalhados (APP) neste período considerado. No entanto, atualmente, com a vacinação em massa no Brasil já ter superado mais de 70% da população, os transtornos provocados pela variante ômicron são menores do que as cepas anteriores, haja visto que esta nova variante ataca apenas as vias aéreas superiores (boca, nariz e garganta) das pessoas contaminadas e já imunizadas, e não mais agredindo os pulmões.

Sabe-se que durante a pandemia e as regras de isolamento social, muitas pessoas passaram a cultivar uma vida sedentária e com considerável aumento da obesidade. Além disso, agravaram-se entre as populações de vários países problemas relacionados ao estresse, depressão e distúrbios mentais de variadas ordens. Sabe-se também da importância das práticas de exercícios físicos de forma contínua e regular como instrumento eficaz no auxílio do combate ao estresse, do sedentarismo e da obesidade. Os exercícios físicos podem auxiliar na construção de uma qualidade de vida melhor para a população em tempos de pandemia e até ajudar no equilíbrio do sistema imunológico, desde que sejam respeitadas as regras de distanciamento social, ventilação dos ambientes, utilização de máscaras e a lavagem das mãos. Recomenda-se ainda a prática de exercícios físicos em locais abertos, ao ar livre e sem aglomerações de pessoas. Todavia, devido às sequelas graves provocadas pela covid-19 em pacientes já recuperados, a prescrição de exercícios físicos e de treinos, tem trazido grande preocupação e cautela entre os professores de educação física e os médicos, justamente para aquelas pessoas que já receberam alta, mesmo para os que apresentaram casos leves da doença. As atividades aeróbicas, como a prática da natação, por exemplo, não são recomendadas para pessoas que já tiveram a Covid-19, principalmente devido aos problemas correlacionados às inflamações do miocárdio que afetam grande parte destes pacientes. A sugestão é a realização de exames detalhados do coração e aguardar por cerca de três (3) meses, com acompanhamento médico, para o retorno efetivo dos exercícios físicos (aeróbicos), incluso aqui a natação. Abaixo os fluxogramas para o retorno das atividades aeróbicas para pacientes que receberam alta da covid-19. No primeiro fluxograma o algoritmo a ser seguido para aqueles esportistas de práticas recreativas e no segundo gráfico o algoritmo para atletas de alto rendimento no período pós alta de covid-19.



 Figura 02 - Fluxograma para retorno de exercicios físicos em esportistas de recreação após a alta da covid-19.





                          

 Figura 03 - Fluxograma para retorno de exercícios  físicos em  atletas de alto rendimento após a alta de covid-19.





Referências

 [1] https://www.portal.cardiol.br/post/posicionamento-sobre-avaliacao-pre-participacao-cardiologica-apos-a-covid-19

Ômicron: Escolas Abertas e Crianças em Perigo

 



(Escrito por Renato Coelho)

No atual momento da pandemia no Brasil, com mais de 622 mil mortes (sendo estes dados oficiais subnotificados), e quando a pandemia ainda se encontra totalmente fora de controle, um tema vem novamente ao debate: o retorno das aulas presenciais nas escolas do país. Segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), são cerca de 44 milhões de estudantes fora das escolas somente no Brasil (OPAS, 2020). Ainda segundo dados da UNICEF são inúmeros os problemas mentais e psicológicos que podem afetar as crianças devido ao tempo prolongado de fechamento das escolas:

 

O fechamento das escolas tem impactos profundos na vida de crianças e adolescentes. Com o início da pandemia no Brasil, em março, estima-se que 44 milhões de estudantes ficaram longe das salas de aula. Tendo em vista as diferentes realidades brasileiras, as opções de atividades para a continuidade das aprendizagens em casa não estão se dando de forma igual para todos. Manter as escolas fechadas por muito tempo pode agravar ainda mais as desigualdades de aprendizagem no país, impactando em especial meninas e meninos em situação de vulnerabilidade (Bauer, F. apud OPAS (2020))

 

Sabe-se, no entanto, que a retomada das aulas presenciais, sejam em escolas, creches ou universidades depende exclusivamente do controle da pandemia no país, a fim de garantir a segurança do convívio entre alunos, professores e todos os familiares envolvidos. São evidentes os vários problemas psicológicos, emocionais e que também afetam o desenvolvimento das crianças e jovens pelo fato das escolas ainda estarem fechadas, porém, uma atitude irresponsável e insana seria autorizar o reinício das atividades presenciais em escolas no ápice de uma terceira onda da covid-19 no Brasil e agravado por uma nova mutação do vírus Sars-Cov-2, denominada Ômicron, detectada primeiramente na África do Sul, mas que já possui transmissão comunitária em praticamente todo o território nacional, e já representa cerca de100% das testagens genômicas no país. A transmissibilidade é cerca de dez (10) vezes maior que as cepas anteriores e representa alto risco para a população não vacinada, como é o caso específico das crianças em idade escolar.

É importante destacarmos, que antes mesmo de se iniciar a  discussão sobre o retorno das aulas presenciais no Brasil, se torna ainda mais urgente e imprescindível  para toda a sociedade, o debate pleno e aberto sobre a realidade do (des)controle da pandemia em todas as regiões do país, ou seja, o retorno das aulas presenciais deve estar correlacionado ao controle eficaz da pandemia, saber onde está o vírus dentro de cada região e cidades do território nacional, possuir mecanismos para mitigar surtos e novos contágios, promoção e aceleração da vacinação infantil, estratégias de realização de testagem em massa e a universalização do atendimento hospitalar aos infectados. Porém, não é o que se observa atualmente no país, ao contrário, observamos uma obsessão pelo retorno imediato das aulas presenciais nas escolas brasileiras e pelas flexibilizações das regras de isolamento social, pressão essa reproduzida pelos secretários municipais e estaduais de educação, e cuja origem reside nos interesses comerciais e financeiros dos grandes proprietários de escolas privadas, que tiveram seus lucros subtraídos com a  pandemia e que agora pressionam os gestores públicos para a reabertura de todas as escolas, públicas e privadas ao mesmo tempo, independente dos estudos dos índices de transmissão do vírus sars-Cov-2 nas cidades, demonstrando assim, que a pandemia no Brasil (e no mundo todo) se transformou num verdadeiro extermínio de classe, onde os impactos e mortes atingem de forma desproporcional e seletiva as classes mais pobres que não possuem acesso a assistência médico hospitalar de qualidade.

É notória a importância das escolas no desenvolvimento e na aprendizagem de crianças, jovens e adolescentes. As atividades coletivas, as tarefas em grupo e as aglomerações infantis potencializam o desenvolvimento das chamadas funções psicológicas superiores nas crianças, como a memória, o raciocínio, a linguagem e a escrita. Porém, com o início da pandemia do novo coronavírus, a partir do primeiro semestre de 2020, as aulas presenciais em escolas e universidades em todo o país foram suspensas como medida de mitigação de novos contágios pelo vírus Sars-Cov-2. As aglomerações humanas são as principais causas de contágios da covid-19, e as escolas e as universidades possuem uma dinâmica pedagógica e também uma arquitetura própria que tem como objetivo promover e incentivar as aglomerações, já que as atividades em grupo são facilitadores da aprendizagem. A começar pela arquitetura das salas de aula com dezenas de carteiras organizadas em filas paralelas ou em círculos, a organização do pátio e as atividades do recreio são planejadas em função das interações e aglomerações das crianças, a fim de permitir maior interação e sociabilidade. Podemos ainda citar os restaurantes e os banheiros coletivos de escolas que também possuem uma arquitetura que favorece as interações humanas. Entretanto, devido à voraz dinâmica de contágios do vírus Sars-Cov-2, mesmo com o início da Campanha Nacional de Imunização (vacinação) no Brasil, mudanças estruturais profundas deverão ser realizadas dentro da educação escolar em todos os níveis e também na educação superior para a mitigação de novos contágios de Covid-19 e de suas variantes futuras. As mudanças necessárias serão não apenas referentes ao número de alunos por sala, mas também com mudanças estruturais que vão desde a arquitetura das escolas, na dinâmica de horários de funcionamento das aulas, na contratação de novos professores (concursos públicos), maiores investimentos na infraestrutura das escolas como acesso à internet, saneamento, ampliação de salas e na construção de banheiros, quadras, jardins e maiores áreas de lazer e de recreação.

Segundo Tokarnia (2020), em relação às condições atuais das escolas no Brasil em tempos de pandemia, apenas 46,7% possuem saneamento básico, ou seja, mais da metade das escolas do país não possui tratamento de esgoto, água encanada ou coleta de resíduos sólidos. Dentro desta pesquisa apenas 30% das escolas públicas e privadas no Brasil possuem áreas verdes, quadras e áreas de lazer.

Quando se fala sobre o quesito infraestrutura escolar, segundo o Censo Escolar 2017, nas escolas de ensino fundamental no Brasil apenas 65,8% das escolas públicas possuem água encanada (água potável), 46,8% possuem laboratório de informática, 65,6% têm acesso à internet e nas escolas de educação infantil apenas 61,1% possuem banheiro adequado à sua faixa etária. No que se refere às creches, apenas 57,6% possuem parque infantil e para a pré-escola essa porcentagem cai para 42,7%, e menos de 30% das creches e das pré-escolas possuem áreas verdes (MARTINS, 2018).

Essa realidade escolar brasileira é um entrave para a reabertura das escolas e para a flexibilização das atividades de aulas presenciais. Considerando tal contexto em que se insere a maioria das escolas no país, com destaque para a total falta de infraestrutura dos espaços escolares, haverá a potencialização de novos contágios e de óbitos na reabertura de escolas ou creches durante o período atual de crescimento da segunda onda no país, com altos índices de transmissão do vírus (Rt>1), provocando um aumento expressivo de contaminações e mortes por covid-19 entre os escolares e os seus familiares, agravando mais a espantosa realidade atual dos números da pandemia no Brasil.

 

Por que não se deve iniciar as aulas presenciais atualmente no Brasil com a variante Ômicron?

Segundo dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC - https://www.cdc.gov/) sediado nos EUA, a retomada das atividades escolares na forma presencial somente deve ser recomendada quando o índice de transmissão do novo coronavírus estiver abaixo de 50 casos positivos novos (por dia) para cada um milhão de habitantes, pois essa taxa significa que o risco de transmissão do vírus seria baixo para um ambiente escolar e demonstrando também que a pandemia estaria realmente sob controle numa dada região que apresente estes números. Além disso, para a reabertura das escolas de forma segura, seria também necessário um decréscimo contínuo de no mínimo 4 semanas consecutivas nos índices de contágios e de óbitos numa determinada localidade ou município. Os leitos hospitalares de UTI´s para covid-19 também devem possuir um percentual baixo de ocupação (abaixo de 70%). Vemos assim que nenhuma cidade ou estado do Brasil se enquadraria nestes critérios mínimos de segurança para reabertura de escolas neste início de 2022, no contexto atual da Ômicron. Soma-se a esses dados da pandemia o alto estágio de precarização e de sucateamento em que se encontram atualmente as escolas e creches públicas do país, que não possuem condições mínimas em promover a higiene e distanciamento dos alunos para prevenção de novos contágios. Portanto, o forte apelo para o retorno imediato das aulas deveria ser substituído pelo debate sobre maiores investimentos nas escolas, ampliação do número de salas de aulas, saneamento e instalação de água potável nas escolas, ampliação da oferta de internet gratuita aos estudantes, realização de novos concursos públicos para docentes e o fornecimento de auxílio financeiro às famílias dos estudantes de escolas públicas durante o período da pandemia.

 

Por que não se recomenda o retorno das aulas presenciais hoje?

No mundo moderno, as escolas são ambientes complexos e locais de aglomerações de pessoas. São espaços singulares e cuja dinâmica espacial e temporal segue uma lógica fordista de funcionamento, com crianças em filas, carteiras enfileiradas, corredores e salas dispostos também de forma linear imitando um ambiente de produção fabril. O advento da pandemia do vírus Sars-Cov-2 colocou em xeque a retomada das aulas presenciais nas escolas e obrigou a continuidade das mesmas no chamado Ensino à Distância (EaD), com todos os seus problemas e limitações, como a  exclusão e deficiências das aulas virtuais.

Segundo uma recente pesquisa realizada pela Universidade de Granada (UGR) na Espanha sobre a retomada das aulas presenciais naquele país, que nos trazem números e fatos importantes sobre as relações entre a dinâmica de interações das escolas e o comportamento do vírus Sars-Cov-2 (ARROYO, 2020).

Segundo os pesquisadores da Universidade de Granada, considerando a realidade espanhola, de uma sala de aula com vinte (20) crianças, considerando que a família destas crianças escolares é constituída pelo pai, mãe com um (1) ou dois (2) filhos (nesta simulação do cálculo considera-se que metade dos alunos tenham um irmão que também estuda na mesma escola e a outra metade é composta por crianças consideradas “filho único”). Ao se considerar todos os contatos realizados por uma única criança, apenas no seu primeiro dia de aula, e sem considerar os contatos externos à escola (rua, mercado, ônibus, etc.) será contabilizado 74 contatos com outras pessoas da escola, ou seja, cada criança da escola será exposta a outras 74 pessoas no seu primeiro dia de aula, considerado apenas os contatos exclusivos com sujeitos da sala de aula e da família (ver Figura 01 abaixo).

 


Figura 01 – Esquema do número total de contatos entre alunos de uma mesma escola.


Para o segundo dia de aula, desconsiderando as regras de distanciamento social, os contatos sobem para 808 interações para cada aluno da classe. Já para o terceiro dia as interações serão de 15.000 para cada aluno. Os números comprovam o grande risco de uma criança da sala estiver infectada com a Covid-19, elevando o grau de contaminação para toda a escola. A partir daí, pode-se ter uma noção dos riscos em se abrir as escolas em período de pandemia, pois é colocado em risco nesta situação, não somente a saúde mental das crianças ou o seu futuro desenvolvimento, mas acima de tudo a própria vida da criança é colocada em risco, principalmente em um retorno às aulas presenciais num momento de alta de casos e de contágios, e ainda com um retorno de forma pragmática e sem planejamento como estamos presenciando. 


Tabela 01 – Número de interações entre alunos durante os primeiros dias de aulas presenciais na escola

Imaginemos então como se daria a replicação destes contatos diários nas escolas brasileiras, onde a massificação de turmas, com médias superiores a 40 alunos por sala, a falta de professores concursados, salas pequenas e com pouca ventilação, banheiros inadequados e sem água potável em muitas escolas do país. Obviamente que as escolas se tornariam assim espaços ou eventos denominados de super-espalhadores, com potencial aumento de surtos e de contágios pelo novo coronavírus entre a sociedade.

Mesmo havendo o uso de máscaras e com as regras de distanciamento social dentro das escolas, não é recomendado o retorno das aulas presenciais quando houver alta de contágios numa cidade, região ou país (Rt>1), pois todos os protocolos de biossegurança neste contexto se tornam ineficazes. Quando se vivencia um momento de alta de contágios e de óbitos, não há outra alternativa, a não ser o isolamento social e a suspensão completa das aulas presenciais. A sugestão é priorizar a vida dos escolares e não as aulas em si, pois o retorno seguro das aulas presenciais no Brasil se dará somente após a efetivação da Campanha Nacional de Imunização para todas as crianças (vacinação), já que não temos políticas públicas de mitigação de contágios como testagem em massa, rastreamento de novos conatos, ampliação de leitos de UTI’s e de atendimento médico hospitalar de qualidade para toda a população.

 

 

O que fazer com as crianças dentro de casa com o fechamento das escolas?  Como promover o desenvolvimento infantil?


Atualmente as crianças estão sendo uma das maiores vítimas da pandemia da Covid-19 em todo o mundo. Talvez sejam as que mais estão sendo afetadas pelas regras de isolamento social decretada por diversos países ao redor do planeta, já que as crianças constituem o grupo que mais tempo tem experimentado o confinamento de forma contínua em casa, haja visto o fechamento de escolas e creches há quase um ano. Não há dúvidas que para a maioria das crianças, o isolamento social afeta drasticamente o seu desenvolvimento motor, cognitivo e social, já que as interações e os relacionamentos coletivos nesta faixa etária são primordiais para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores da mente.

Várias escolas e creches de vários países distintos ensaiaram o retorno às aulas presenciais, mas devido ao alto número de surtos e contágios pelo novo coronavírus e de suas mutações mais transmissíveis e contagiosas, tais escolas fecharam novamente os seus portões, seja na Europa, Ásia, Oceania, África ou na América. O retorno às aulas presenciais no atual momento da pandemia no Brasil se torna algo totalmente impossível, sejam quais forem os protocolos de segurança sanitária, pois as novas variantes do vírus são cerca de dez (10) vezes mais contagiosas, tornando inevitáveis surtos entre crianças escolares, pois as escolas são por natureza ambientes de aglomerações.

No caso específico da cidade de Goiânia, que atualmente experimenta terceira onda com índice de transmissão superior a um (01) Rt>1, e com previsões de pico de contágios provavelmente para os meses de fevereiro de 2022, o recomendado neste contexto é ainda o isolamento social e a adoção somente de aulas virtuais (on-line), ao contrário do que diz em as autoridades locais que estão permitindo a abertura de escolas 100% presenciais.

Neste momento tão complexo, difícil e delicado, sugerimos alternativas para a promoção de um estilo de vida mais saudável e humanizado para as crianças durante a pandemia. Ainda que as crianças estejam em aulas remotas e sem aulas presencias, é possível criar uma rotina saudável, lúdica e humanizada para as crianças em tempos de isolamento social na pandemia.

Uma das principais considerações e argumentos para a manutenção das aulas presencias para as crianças na pandemia, diz respeito ao atraso no desenvolvimento infantil, e podendo produzir sequelas no desenvolvimento e na aprendizagem das crianças. Porém, o que os defensores desta tese desconsideram, são as sequelas ainda piores e mais agressivas provocadas pela covid-19 em crianças, ou seja, as síndromes pós covid-19, além de graves e duradouras, sejam em crianças ou em adultos, possui um outro importante agravante, tais sequelas e síndromes são totalmente desconhecidas a longo prazo, podendo gerar doenças crônicas, ou seja, que até o presente momento não possuindo cura pela medicina. Portanto, colocando tudo na balança, é notório que ser contaminado por covid-19 pode acarretar danos e problemas maiores do que aqueles provocados pelo isolamento social em si e pela ausência às aulas presenciais. A verdade é que os problemas relacionados ao retardo no desenvolvimento ou na aprendizagem podem ser sanados e recuperados a curto ou médio prazos, porém, as sequelas e os danos da covid-19 ainda são uma grande incógnita e a ciência ou a medicina não podem garantir nada sobre este tema novo e recente relacionado às consequências da covid-19 a longo prazo na infância.

A sugestão é não levar as crianças às aulas presenciais nas escolas, e sim criar atividades lúdicas em casa a fim de provocar um desenvolvimento infantil capaz de amenizar os danos provocados pelo isolamento social intermitente. Obviamente que nada substitui as interações sociais entre as crianças e é sabido por todos a péssima qualidade e exclusão das aulas remostas (EaD), porém, as ações lúdicas sugeridas para as crianças se refere ao período atual da pandemia. A nossa proposta é baseada na Teoria Histórico Cultural de Vigotski sobre o lúdico e a infância. Seja em casa, no quintal, na praça, na rua ou nos parques infantis, estes são ambientes mais seguros do que as escolas para as crianças, desde que as visitas a estes ambientes estejam autorizados pelas autoridades sanitárias e que sejam escolhidos horários com menor fluxo de pessoas, e também mantendo os contatos somente com sujeitos da mesma família, com o uso de mácaras, álcool em gel e com distanciamento social (sem aglomerações). As escolas são projetadas em função das aglomerações, e por natureza são ambientes de múltiplos contatos, e que em tempos de pandemia podem propiciar novos surtos e acelerar os contágios.

Em Goiânia, somente no nesta segunda quinzena de janeiro de 2022, mais de 200 escolas municipais ligadas à Secretaria Municipal de Goiânia (SME) tiveram que ser fechadas devido a surtos de covid-19 provocados pela variante Ômicron, que é mais transmissível do que o sarampo. Goiânia foi a primeira capital do país a abrir as escolas em regime presencial, o início das aulas foi no dia 17 de janeiro de 2022, e em pleno pico de contágios provocados pela super onda da variante Ômicron, com mais de 180 mil contágios/dia, demonstrando a atitude irresponsável e insana dos gestores públicos em Goiás. A falta de professores nas escolas devido a contágios por covid-19 tem provocado a suspensão de aulas e o fechanto de escolas inteiras. Prova-se assim, que escola não é lugar seguro em tempos de pandemia, muito ao contrário, a abertura deve respeitar as leis e diretrizes a da ciência epidemiológica.


A Criança, o Brincar e a Teoria Histórico Cultural

O enfoque histórico-cultural se fundamenta essencialmente no fato de que o desenvolvimento psicológico humano é um processo complexo, cujas origens se encontram nas condições e organizações do contexto social e cultural, construídos ao longo das vivências do indivíduo.

A análise histórico-cultural elaborada por Vygotski foi altamente influenciada pelas concepções do materialismo histórico dialético de Marx e Engels, de onde ele extraiu os conceitos sobre atividade, mediação semiótica e a ideia central de que o ser social determina a consciência social.

Vygotski considerava ainda a dupla dimensão do ser humano, sujeito e sujeitado, dando grande importância à participação do outro no processo de significação e constituição do sujeito, sem negar a efetiva participação do Eu, social e historicamente produzido. (ZANELLA e ANDRADA, 2002, p.127).

Vygotski lutou durante toda a vida para mudar todo o paradigma de sua época, ao explicar que o psíquico humano não era apenas algo inerente ao desenvolvimento biológico, era na verdade uma realidade complexa e dinâmica entre o biológico, o social e o cultural.

  

Vigotski esclarece que o desenvolvimento é um processo dialético, marcado por etapas qualitativamente diferentes determinadas pela atividade mediada, justamente o que o promove. Via atividade o homem (entendido enquanto sujeito genérico) é capaz de transformar sua própria história e a história da humanidade, posto que por seu intermédio transforma o contexto social em que se insere e ao mesmo tempo se transforma. (ZANELLA E ANDRADA, 2002, p.128)

 Para Vygotski o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores não são idênticos, nem redutíveis aos fatores que explicam os processos psicológicos elementares, com os quais estão relacionados os processos de desenvolvimento natural. Os processos psicológicos superiores se firmam a partir da participação dos sujeitos em atividades sociais valendo-se de instrumentos de mediação.

O ensino deve servir então como elemento inerente aos processos de desenvolvimento da criança. E é durante tal desenvolvimento dessas relações organizadas que evoluem as funções psíquicas superiores da criança.

A partir da compreensão de que o bom ensino deve operar sobre as conquistas de desenvolvimento ainda em aquisição e adquiridas com auxílio do outro, surge o conceito de desenvolvido por Vygotski de Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI):

A distância entre o nível evolutivo real determinado pela resolução independente do problema e o nível de desenvolvimento potencial determinado pela resolução de um problema sob a orientação de um adulto ou em colaboração com os colegas mais capazes. (VYGOTSKY, 1998, p.86).

Este é um dos conceitos centrais da teoria de Vygotski, é a chamada zona de desenvolvimento iminente, que é a distância que existe entre o que a criança sabe fazer sozinha e o que pode fazer com a ajuda do outro.

As atividades quando inseridas dentro da Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI) permitem trabalhar sobre as funções ainda em desenvolvimento, que não foram plenamente consolidadas, criando uma estreita conexão entre aprendizagem e desenvolvimento, contribuindo para a formulação de indicadores didáticos e avaliativos para o desenvolvimento infantil, quando favorecido pela construção de um cenário de aula que considere o contexto sócio-histórico dos alunos.

As teorias de Vygotski se tornam fundamentais para a compreensão e o resgate do valor e importância do jogo e do brinquedo. A contribuição principal de Vygotski sobre o jogo ou o brinquedo, é a sua valorização, acrescida pela estreita relação que este autor estabelece entre o jogo e a aprendizagem.

Uma das situações que se apresentam como importantes para a análise do processo de constituição do sujeito é a brincadeira infantil. Rompendo com a visão tradicional de que a brincadeira é a atividade natural de satisfação de instintos infantis, Vygotski apresenta o brincar como atividade em que tanto significados sociais e historicamente produzidos são veiculados quanto novos podem ali emergir. (ZANELLA e ANDRADA, 2002, P.128).

As intenções e ações lúdicas no jogo possibilitam a criação da Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI), promovendo a internalização do real e o desenvolvimento cognitivo.

Logo, o brincar da criança passa a ser uma transformação criadora, ela também tem a possibilidade de criar, mesmo sob diferentes escalas, mas cria a partir do que conhece e das oportunidades oferecidas, dentro de suas próprias necessidades e preferências. Dentro do jogo resgata-se na criança sua posição de sujeito histórico e social, pois ela cria, ela imagina, ela pode participar ativamente do processo lúdico.

 [...] a criança vê um objeto, mas age de maneira diferente em relação ao que vê. Assim, é alcançada uma condição em que começa a agir independentemente daquilo que vê. (VYGOTSKI, 1998, p. 127).

Portanto, os jogos e brincadeiras possuem papel fundamental para a formação da plasticidade cerebral através de processos criativos, que irão transformar qualitativamente as funções cerebrais.

Considerações Finais

O resgate dos elementos lúdicos através de atividades de jogos e de brincadeiras é de fundamental importância para o desenvolvimento pleno das crianças. O brincar é essencial para o desenvolvimento e para a vida da criança. A sociabilidade e a aprendizagem realizada de forma coletiva permitem a criação da Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI), onde os jogos e brincadeiras se constituem em elementos fundamentais para este processo de ensino e aprendizagem na infância. Portanto, mesmo em tempos de pandemia, sem as aulas presenciais em escolas ou creches, é possível a promoção do desenvolvimento e da aprendizagem infantil, onde o outro que brinca com a criança pode também ser o pai, a mãe, irmãos, ou seja, todos os indivíduos do seu lar ou mesmo grupo familiar. Vemos assim que as aulas presenciais nas escolas poderão ser postergadas até que se garanta completa segurança para o retorno das crianças, sendo substituídas por atividades lúdicas em casa e junto com os familiares. A atual pressão obstinada pelo retorno imediato à aulas presenciais por determinados grupos, visam apenas atender aos interesses de empresas da área educacional e também de donos de escolas particulares que colocam os lucros acima da vida dos alunos. Assistimos atualmente em pleno ápice da pandemia, a tentativa insana da imposição de uma normalidade impossível, e o funcionamento das escolas na forma presencial, visam apenas a criação deste falso normal para a manutenção e continuidade da reprodução do capital, ao custo da saúde e da vida dos trabalhadores e dos filhos dos trabalhadores, caracterizando assim um verdadeiro extermínio de classe. Evidencia-se assim a urgência na superação deste atual modelo de mundo pautado na exploração, na exclusão, no individualismo e na destruição da natureza.

Bibliografia Consultada

ARROYO, J. Colocar 20 crianças numa sala de aula implica em 808 contatos cruzados em dois dias, alerta universidade. Jornal EL PAÍS, jun. 2020.  Disponível em: < https://brasil.elpais.com/sociedade/2020-06-17/colocar-20-criancas-numa-sala-de-aula-implica-em-808-contatos-cruzados-em-dois-dias-alerta-universidade.html>. Acesso em:03/02/21.

MARTINS, H. Censo aponta que escolas públicas ainda têm deficiências de infraestrutura. Agência Brasil EBC, 2018. Disponível em: < https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2018-01/censo-aponta-que-escolas-publicas-ainda-tem-deficiencias-de-infraestrutura>. Acesso em: 03/02/21.

OBSERVATÓRIO COVID-19 BR. Experiência internacional na reabertura de escolas e situação no Brasil: porque não podemos fazer comparações diretas.Set, 2020. Disponível em: < https://covid19br.github.io/analises.html?aba=aba12#>. Acesso em: 03/02/21.

ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Reabertura segura das escolas deve ser prioridade, alertam UNICEF, UNESCO e OPAS/OMS. Set, 2020. Disponível em: < https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6283:reabertura-segura-das-escolas-deve-ser-prioridade-alertam-unicef-unesco-e-opas-oms&Itemid=812>. Acesso em: 03/02/21

TOKARNIA, M. Quase metade das escolas não tem todos os itens de saneamento básico. Agência Brasil EBC, 2020. Disponível em: < https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2020-06/quase-metade-das-escolas-nao-tem-todos-os-itens-de-saneamento-basico>. Acesso em: 03/02/21.

 VYGOTSKY, L.S. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

ZANELLA, A.V.; ANDRADA, E.G.C. Processos de Significação no Brincar: Problematizando a constituição do sujeito. Psicologia em Estudo, Maringá, v.07, n.02, p.127-133, jul/dez. 2002.

 

 

A Educação Física e a Pandemia: desafios e precauções

  

 



(Escrito por Renato Coelho)

No atual momento da pandemia no Brasil, com mais de 220 mil mortes (fevereiro de 2021), e quando a pandemia ainda se encontra totalmente fora de controle, um tema vem novamente ao debate: o retorno das aulas presenciais nas escolas do país. Segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), são cerca de 44 milhões de estudantes fora das escolas somente no Brasil (OPAS, 2020). Ainda segundo dados da UNICEF são inúmeros os problemas mentais e psicológicos que podem afetar as crianças devido ao tempo prolongado de fechamento das escolas:


O fechamento das escolas tem impactos profundos na vida de crianças e adolescentes. Com o início da pandemia no Brasil, em março, estima-se que 44 milhões de estudantes ficaram longe das salas de aula. Tendo em vista as diferentes realidades brasileiras, as opções de atividades para a continuidade das aprendizagens em casa não estão se dando de forma igual para todos. Manter as escolas fechadas por muito tempo pode agravar ainda mais as desigualdades de aprendizagem no país, impactando em especial meninas e meninos em situação de vulnerabilidade (Bauer, F. apud OPAS (2020))

 

Sabe-se, no entanto, que a retomada das aulas presenciais, sejam em escolas, creches ou universidades depende exclusivamente do controle da pandemia no país, a fim de garantir a segurança do convívio entre alunos, professores e todos os familiares envolvidos. São evidentes os vários problemas psicológicos, emocionais e que também afetam o desenvolvimento das crianças e jovens pelo fato das escolas ainda estarem fechadas, porém, uma atitude irresponsável e insana seria autorizar o reinício das atividades presenciais em escolas no ápice de uma segunda onda da covid-19 no Brasil e agravado por uma nova mutação do vírus Sars-Cov-2 (B.1) encontrada primeiramente em Manaus, mas que já possui transmissão comunitária em praticamente todo o território nacional, cuja transmissibilidade é cerca de dez (10) vezes maior e as infecções produzidas mais graves do que as experimentadas pelas cepas de 2020.

É importante destacarmos, que antes mesmo de se iniciar a  discussão sobre o retorno das aulas presenciais no Brasil, se torna ainda mais urgente e imprescindível  para toda a sociedade, o debate pleno e aberto sobre a realidade do (des)controle da pandemia em todas as regiões do país, ou seja, o debate sobre a existência das políticas públicas de testagem em massa, sobre a eficácia e gestão do sistema nacional de vacinação, também sobre a importância da continuidade do auxílio emergencial, a distribuição de oxigênio medicinal nos hospitais, o aumento dos leitos de UTI, o aperfeiçoamento das políticas de isolamento social e de uma maior distribuição de renda durante a pandemia. Para o retorno das aulas presenciais é necessário antes o controle eficaz da pandemia, saber onde está o vírus dentro de cada região e cidades do território nacional, possuir mecanismos para mitigar surtos e novos contágios, estratégias de realização de testagem em massa e a universalização do atendimento hospitalar aos infectados. Porém, não é o que se observa atualmente no país, ao contrário, observamos uma obsessão pelo retorno imediato das aulas presenciais nas escolas brasileiras e pelas flexibilizações das regras de isolamento social, pressão essa reproduzida pelos secretários municipais e estaduais de educação, e cuja origem reside nos interesses comerciais e financeiros dos grandes proprietários de escolas privadas, que tiveram seus lucros subtraídos com a  pandemia e que agora pressionam os gestores públicos para a reabertura de todas as escolas, públicas e privadas ao mesmo tempo, independente dos estudos dos índices de transmissão do vírus sars-Cov-2 nas cidades, demonstrando assim, que a pandemia no Brasil (e no mundo todo) se transformou num verdadeiro extermínio de classe, onde os impactos e mortes atingem de forma desproporcional e seletiva as classes mais pobres que não possuem acesso a assistência médico hospitalar de qualidade.

É notória a importância das escolas no desenvolvimento e na aprendizagem de crianças, jovens e adolescentes. As atividades coletivas, as tarefas em grupo e as aglomerações infantis potencializam o desenvolvimento das chamadas funções psicológicas superiores nas crianças, como a memória, o raciocínio, a linguagem e a escrita. Porém, com o início da pandemia do novo coronavírus, a partir do primeiro semestre de 2020, as aulas presenciais em escolas e universidades em todo o país foram suspensas como medida de mitigação de novos contágios pelo vírus Sars-Cov-2. As aglomerações humanas são as principais causas de contágios da covid-19, e as escolas e as universidades possuem uma dinâmica pedagógica e também uma arquitetura própria que tem como objetivo promover e incentivar as aglomerações, já que as atividades em grupo são facilitadores da aprendizagem. A começar pela arquitetura das salas de aula com dezenas de carteiras organizadas em filas paralelas ou em círculos, a organização do pátio e as atividades do recreio são planejadas em função das interações e aglomerações das crianças, a fim de permitir maior interação e sociabilidade. Podemos ainda citar os restaurantes e os banheiros coletivos de escolas que também possuem uma arquitetura que favorece as interações humanas. Entretanto, devido à voraz dinâmica de contágios do vírus Sars-Cov-2, mesmo com o início da Campanha Nacional de Imunização (vacinação) no Brasil, mudanças estruturais profundas deverão ser realizadas dentro da educação escolar em todos os níveis e também na educação superior para a mitigação de novos contágios de Covid-19 e de suas variantes futuras. As mudanças necessárias serão não apenas referentes ao número de alunos por sala, mas também com mudanças estruturais que vão desde a arquitetura das escolas, na dinâmica de horários de funcionamento das aulas, na contratação de novos professores (concursos públicos), maiores investimentos na infraestrutura das escolas como acesso à internet, saneamento, ampliação de salas e na construção de banheiros, quadras, jardins e maiores áreas de lazer e de recreação.

Segundo Tokarnia (2020), em relação às condições atuais das escolas no Brasil em tempos de pandemia, apenas 46,7% possuem saneamento básico, ou seja, mais da metade das escolas do país não possui tratamento de esgoto, água encanada ou coleta de resíduos sólidos. Dentro desta pesquisa apenas 30% das escolas públicas e privadas no Brasil possuem áreas verdes, quadras e áreas de lazer.

Quando se fala sobre o quesito infraestrutura escolar, segundo o Censo Escolar 2017, nas escolas de ensino fundamental no Brasil apenas 65,8% das escolas públicas possuem água encanada (água potável), 46,8% possuem laboratório de informática, 65,6% têm acesso à internet e nas escolas de educação infantil apenas 61,1% possuem banheiro adequado à sua faixa etária. No que se refere às creches, apenas 57,6% possuem parque infantil e para a pré-escola essa porcentagem cai para 42,7%, e menos de 30% das creches e das pré-escolas possuem áreas verdes (MARTINS, 2018).

Essa realidade escolar brasileira é um entrave para a reabertura das escolas e para a flexibilização das atividades de aulas presenciais. Considerando tal contexto em que se insere a maioria das escolas no país, com destaque para a total falta de infraestrutura dos espaços escolares, haverá uma potencialização de novos contágios e de óbitos na reabertura de escolas, creches e universidades durante o período atual de crescimento da segunda onda no país, com altos índices de transmissão do vírus (Rt>1), provocando um aumento expressivo de contaminações e mortes por covid-19 entre os escolares e os seus familiares, agravando mais a espantosa realidade dos números da pandemia no Brasil.


Por que não se deve iniciar as aulas presenciais atualmente no Brasil?

Segundo dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC - https://www.cdc.gov/) sediado nos EUA, a retomada das atividades escolares na forma presencial somente deve ser recomendada quando o índice de transmissão do novo coronavírus estiver abaixo de 50 casos positivos novos (por dia) para cada um milhão de habitantes, pois essa taxa significa que o risco de transmissão do vírus seria baixo para um ambiente escolar e demonstrando também que a pandemia estaria realmente sob controle numa dada região que apresente estes números. Além disso, para a reabertura das escolas de forma segura, seria também necessário um decréscimo contínuo de no mínimo 4 semanas consecutivas nos índices de contágios e de óbitos numa determinada localidade ou município. Os leitos hospitalares de UTI´s para covid-19 também devem possuir um percentual baixo de ocupação (abaixo de 70%). Vemos assim que nenhuma cidade ou estado do Brasil se enquadraria nestes critérios mínimos de segurança para reabertura de escolas. Soma-se a esses dados da pandemia o alto estágio de precarização e de sucateamento em que se encontram atualmente as escolas e universidades públicas do país, que não possuem condições mínimas em promover a higiene e distanciamento dos alunos para prevenção de novos contágios. Portanto, o forte apelo para o retorno imediato das aulas deveria ser substituído pelo debate sobre maiores investimentos nas escolas, ampliação do número de salas de aulas, saneamento e instalação de água potável nas escolas, ampliação da oferta de internet gratuita aos estudantes, realização de novos concursos públicos para docentes e o fornecimento de auxílio financeiro às famílias dos estudantes de escolas públicas durante o período da pandemia.

 

Por que não se recomenda o retorno das aulas presenciais hoje?

No mundo moderno, as escolas são ambientes complexos e locais de aglomerações de pessoas. São espaços singulares e cuja dinâmica espacial e temporal segue uma lógica fordista de funcionamento, com crianças em filas, carteiras enfileiradas, corredores e salas dispostos também de forma linear imitando um ambiente de produção fabril. O advento da pandemia do vírus Sars-Cov-2 colocou em xeque a retomada das aulas presenciais nas escolas e obrigou a continuidade das mesmas no chamado Ensino à Distância (EaD), com a  exclusão e as limitações das aulas virtuais.

Segundo uma recente pesquisa realizada pela Universidade de Granada (UGR) na Espanha sobre a retomada das aulas presenciais naquele país nos trazem números e fatos importantes sobre as relações entre a dinâmica de interações das escolas e o comportamento do vírus Sars-Cov-2 (ARROYO, 2020).

Segundo os pesquisadores da Universidade de Granada, considerando a realidade espanhola, de uma sala de aula com vinte (20) crianças, sendo que a família destas crianças escolares é constituída pelo pai, mãe com um (1) ou dois (2) filhos (nesta simulação do cálculo considera-se que metade dos alunos tenham um irmão que também estuda na mesma escola e a outra metade é composta por crianças consideradas “filho único”). Ao se considerar todos os contatos realizados por uma única criança, apenas no seu primeiro dia de aula, e sem considerar os contatos externos à escola (rua, mercado, ônibus, etc.) será contabilizado 74 contatos com outras pessoas da escola, ou seja, cada criança da escola será exposta a outras 74 pessoas no seu primeiro dia de aula, considerado apenas os contatos exclusivos com sujeitos da sala de aula e da família (ver Figura 01 abaixo).



Figura 01 – Esquema do número total de contatos entre alunos de uma mesma escola.



Para o segundo dia de aula, desconsiderando as regras de distanciamento social, os contatos sobem para 808 interações para cada aluno da classe. Já para o terceiro dia as interações serão de 15.000 para cada aluno. Os números comprovam o grande risco de uma criança da sala estiver infectada com a Covid-19, elevando o grau de contaminação para toda a escola. A partir daí, pode-se ter uma noção dos riscos em se abrir as escolas em período de pandemia, pois é colocado em risco nesta situação, não somente a saúde mental das crianças ou o seu futuro desenvolvimento, mas acima de tudo a própria vida da criança é colocada em risco, principalmente em um retorno às aulas presenciais num momento de alta de casos e de contágios, e ainda com um retorno de forma pragmática e sem planejamento como estamos presenciando. 


Tabela 01 – Número de interações entre alunos durante os primeiros dias de aulas presenciais na escola

Imaginemos então como se daria a replicação destes contatos diários nas escolas brasileiras, onde a massificação de turmas, com médias superiores a 40 alunos por sala, a falta de professores concursados, salas pequenas e com pouca ventilação, banheiros inadequados e sem água potável em muitas escolas do país. Obviamente que as escolas se tornariam assim espaços ou eventos denominados de super-espalhadores, com potencial aumento de surtos e de contágios pelo novo coronavírus entre a sociedade.

Mesmo havendo o uso de máscaras e com as regras de distanciamento social dentro das escolas, não é recomendado o retorno das aulas presenciais quando houver alta de contágios numa cidade, região ou país (Rt>1), pois todos os protocolos de biossegurança neste contexto podem ser ineficazes. Quando se vivencia um momento de alta de contágios e de óbitos, não há outra alternativa, a não ser o isolamento social e a suspensão completa das aulas presenciais. A sugestão é priorizar a vida dos escolares e não as aulas em si, pois o retorno seguro das aulas presenciais no Brasil se dará somente após a efetivação da Campanha Nacional de Imunização (vacinação), já que não temos políticas públicas de mitigação de contágios como testagem em massa, rastreamento de novos conatos, ampliação de leitos de UTI’s e de atendimento médico hospitalar de qualidade para toda a população.

Bibliografia Consultada

ARROYO, J. Colocar 20 crianças numa sala de aula implica em 808 contatos cruzados em dois dias, alerta universidade. Jornal EL PAÍS, jun. 2020.  Disponível em: < https://brasil.elpais.com/sociedade/2020-06-17/colocar-20-criancas-numa-sala-de-aula-implica-em-808-contatos-cruzados-em-dois-dias-alerta-universidade.html>. Acesso em:03/02/21.

MARTINS, H. Censo aponta que escolas públicas ainda têm deficiências de infraestrutura. Agência Brasil EBC, 2018. Disponível em: < https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2018-01/censo-aponta-que-escolas-publicas-ainda-tem-deficiencias-de-infraestrutura>. Acesso em: 03/02/21.

OBSERVATÓRIO COVID-19 BR. Experiência internacional na reabertura de escolas e situação no Brasil: porque não podemos fazer comparações diretas.Set, 2020. Disponível em: < https://covid19br.github.io/analises.html?aba=aba12#>. Acesso em: 03/02/21.

ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Reabertura segura das escolas deve ser prioridade, alertam UNICEF, UNESCO e OPAS/OMS. Set, 2020. Disponível em: < https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6283:reabertura-segura-das-escolas-deve-ser-prioridade-alertam-unicef-unesco-e-opas-oms&Itemid=812>. Acesso em: 03/02/21

TOKARNIA, M. Quase metade das escolas não tem todos os itens de saneamento básico. Agência Brasil EBC, 2020. Disponível em: < https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2020-06/quase-metade-das-escolas-nao-tem-todos-os-itens-de-saneamento-basico>. Acesso em: 03/02/21.

 

 


Escola Estadual Murilo Braga - Goiânia Goiás (bairro de Vila Nova)


(Escrito por Renato Coelho)

Atualmente as crianças estão sendo uma das maiores vítimas da pandemia da Covid-19 em todo o mundo. Talvez sejam as que mais estão sendo afetadas pelas regras de isolamento social decretada por diversos países ao redor do planeta, já que as crianças constituem o grupo que mais tempo tem experimentado o confinamento de forma contínua em casa, haja visto o fechamento de escolas e creches há quase um ano. Não há dúvidas que para a maioria das crianças, o isolamento social afeta drasticamente o seu desenvolvimento motor, cognitivo e social, já que as interações e os relacionamentos coletivos nesta faixa etária são primordiais para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores da mente.

Várias escolas e creches de vários países distintos ensaiaram o retorno às aulas presenciais, mas devido ao alto número de surtos e contágios pelo novo coronavírus e de suas mutações mais transmissíveis e contagiosas, tais escolas fecharam novamente os seus portões, seja na Europa, Ásia, Oceania, África ou na América. O retorno às aulas presenciais no atual momento da pandemia no Brasil se torna algo totalmente impossível, sejam quais forem os protocolos de segurança sanitária, pois as novas variantes do vírus são cerca de dez (10) vezes mais contagiosas, tornando inevitáveis surtos entre crianças escolares, pois as escolas são por natureza ambientes de aglomerações.

O que fazer então com as nossas crianças?

No caso específico da cidade de Goiânia, que atualmente experimenta uma segunda onda com índice de transmissão superior a um (01) Rt>1, e com previsões de pico de contágios provavelmente para os meses de março e abril, o recomendado neste contexto é ainda o isolamento social e a adoção somente de aulas virtuais (on-line), ao contrário do que diz em as autoridades locais que estão permitindo a abertura de escolas com 30% de ocupação e sistema de rodízio de alunos e de turmas.

Neste momento tão complexo, difícil e delicado, sugerimos alternativas para a promoção de um estilo de vida mais saudável e humanizado para as crianças durante a pandemia. Ainda que as crianças estejam em aulas remotas e sem aulas presencias, é possível criar uma rotina saudável, lúdica e humanizada para as crianças em tempos de isolamento social na pandemia.

Uma das principais considerações e argumentos para a manutenção das aulas presencias para as crianças na pandemia, diz respeito ao atraso no desenvolvimento infantil, e podendo produzir sequelas no desenvolvimento e na aprendizagem das crianças. Porém, o que os defensores desta tese desconsideram, são as sequelas ainda piores e mais agressivas provocadas pela covid-19 em crianças, ou seja, as síndromes pós covid-19, além de graves e duradouras, sejam em crianças ou em adultos, possui um outro importante agravante, tais sequelas e síndromes são totalmente desconhecidas a longo prazo, podendo gerar doenças crônicas, ou seja, que até o presente momento não possuindo cura pela medicina. Portanto, colocando tudo na balança, é notório que ser contaminado por covid-19 pode acarretar danos e problemas maiores do que aqueles provocados pelo isolamento social em si e pela ausência às aulas presenciais. A verdade é que os problemas relacionados ao retardo no desenvolvimento ou na aprendizagem podem ser sanados e recuperados a curto ou médio prazos, porém, as sequelas e os danos da covid-19 ainda são uma grande incógnita e a ciência ou a medicina não podem garantir nada sobre este tema novo e recente relacionado às consequências da covid-19 a longo prazo na infância.

A sugestão é não levar as crianças às aulas presenciais nas escolas, e sim criar atividades lúdicas em casa a fim de provocar um desenvolvimento infantil capaz de amenizar os danos provocados pelo isolamento social intermitente. Obviamente que nada substitui as interações sociais entre as crianças e é sabido por todos a péssima qualidade e exclusão das aulas remostas (EaD), porém, as ações lúdicas sugeridas para as crianças se refere ao período atual da pandemia, que deverá ainda perdurar por alguns duros anos. A nossa proposta é baseada na Teoria Histórico Cultural de Vigotski sobre o lúdico e a infância. Seja em casa, no quintal, na praça, na rua ou nos parques infantis, estes são ambientes mais seguros do que as escolas para as crianças, desde que as visitas a estes ambientes estejam autorizados pelas autoridades sanitárias e que sejam escolhidos horários com menor fluxo de pessoas, e também mantendo os contatos somente com sujeitos da mesma família, com o uso de mácaras, álcool em gel e com distanciamento social (sem aglomerações). As escolas são projetadas em função das aglomerações, e por natureza são ambientes de múltiplos contatos, e que em tempos de pandemia podem propiciar novos surtos e acelerar os contágios.

 

A Criança, o Brincar e a Teoria Histórico Cultural

O enfoque histórico-cultural se fundamenta essencialmente no fato de que o desenvolvimento psicológico humano é um processo complexo, cujas origens se encontram nas condições e organizações do contexto social e cultural, construídos ao longo das vivências do indivíduo.

A análise histórico-cultural elaborada por Vygotski foi altamente influenciada pelas concepções do materialismo histórico dialético de Marx e Engels, de onde ele extraiu os conceitos sobre atividade, mediação semiótica e a ideia central de que o ser social determina a consciência social.

Vygotski considerava ainda a dupla dimensão do ser humano, sujeito e sujeitado, dando grande importância à participação do outro no processo de significação e constituição do sujeito, sem negar a efetiva participação do Eu, social e historicamente produzido. (ZANELLA e ANDRADA, 2002, p.127).

Vygotski lutou durante toda a vida para mudar todo o paradigma de sua época, ao explicar que o psíquico humano não era apenas algo inerente ao desenvolvimento biológico, era na verdade uma realidade complexa e dinâmica entre o biológico, o social e o cultural.

  

Vigotski esclarece que o desenvolvimento é um processo dialético, marcado por etapas qualitativamente diferentes determinadas pela atividade mediada, justamente o que o promove. Via atividade o homem (entendido enquanto sujeito genérico) é capaz de transformar sua própria história e a história da humanidade, posto que por seu intermédio transforma o contexto social em que se insere e ao mesmo tempo se transforma. (ZANELLA E ANDRADA, 2002, p.128)

 Para Vygotski o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores não são idênticos, nem redutíveis aos fatores que explicam os processos psicológicos elementares, com os quais estão relacionados os processos de desenvolvimento natural. Os processos psicológicos superiores se firmam a partir da participação dos sujeitos em atividades sociais valendo-se de instrumentos de mediação.

O ensino deve servir então como elemento inerente aos processos de desenvolvimento da criança. E é durante tal desenvolvimento dessas relações organizadas que evoluem as funções psíquicas superiores da criança.

A partir da compreensão de que o bom ensino deve operar sobre as conquistas de desenvolvimento ainda em aquisição e adquiridas com auxílio do outro, surge o conceito de desenvolvido por Vygotski de Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI):

A distância entre o nível evolutivo real determinado pela resolução independente do problema e o nível de desenvolvimento potencial determinado pela resolução de um problema sob a orientação de um adulto ou em colaboração com os colegas mais capazes. (VYGOTSKY, 1998, p.86).

Este é um dos conceitos centrais da teoria de Vygotski, é a chamada zona de desenvolvimento iminente, que é a distância que existe entre o que a criança sabe fazer sozinha e o que pode fazer com a ajuda do outro.

As atividades quando inseridas dentro da Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI) permitem trabalhar sobre as funções ainda em desenvolvimento, que não foram plenamente consolidadas, criando uma estreita conexão entre aprendizagem e desenvolvimento, contribuindo para a formulação de indicadores didáticos e avaliativos para o desenvolvimento infantil, quando favorecido pela construção de um cenário de aula que considere o contexto sócio-histórico dos alunos.

As teorias de Vygotski se tornam fundamentais para a compreensão e o resgate do valor e importância do jogo e do brinquedo. A contribuição principal de Vygotski sobre o jogo ou o brinquedo, é a sua valorização, acrescida pela estreita relação que este autor estabelece entre o jogo e a aprendizagem.

Uma das situações que se apresentam como importantes para a análise do processo de constituição do sujeito é a brincadeira infantil. Rompendo com a visão tradicional de que a brincadeira é a atividade natural de satisfação de instintos infantis, Vygotski apresenta o brincar como atividade em que tanto significados sociais e historicamente produzidos são veiculados quanto novos podem ali emergir. (ZANELLA e ANDRADA, 2002, P.128).

As intenções e ações lúdicas no jogo possibilitam a criação da Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI), promovendo a internalização do real e o desenvolvimento cognitivo.

Logo, o brincar da criança passa a ser uma transformação criadora, ela também tem a possibilidade de criar, mesmo sob diferentes escalas, mas cria a partir do que conhece e das oportunidades oferecidas, dentro de suas próprias necessidades e preferências. Dentro do jogo resgata-se na criança sua posição de sujeito histórico e social, pois ela cria, ela imagina, ela pode participar ativamente do processo lúdico.

 [...] a criança vê um objeto, mas age de maneira diferente em relação ao que vê. Assim, é alcançada uma condição em que começa a agir independentemente daquilo que vê. (VYGOTSKI, 1998, p. 127).

Portanto, os jogos e brincadeiras possuem papel fundamental para a formação da plasticidade cerebral através de processos criativos, que irão transformar qualitativamente as funções cerebrais.

Considerações Finais

O resgate dos elementos lúdicos através de atividades de jogos e de brincadeiras é de fundamental importância para o desenvolvimento pleno das crianças. O brincar é essencial para o desenvolvimento e para a vida da criança. A sociabilidade e a aprendizagem realizada de forma coletiva permitem a criação da Zona de Desenvolvimento Iminente (ZDI), onde os jogos e brincadeiras se constituem em elementos fundamentais para este processo de ensino e aprendizagem na infância. Portanto, mesmo em tempos de pandemia, sem as aulas presenciais em escolas ou creches, é possível a promoção do desenvolvimento e da aprendizagem infantil, onde o outro que brinca com a criança pode também ser o pai, a mãe, irmãos, ou seja, todos os indivíduos do seu lar ou mesmo grupo familiar. Vemos assim que as aulas presenciais nas escolas poderão ser postergadas até que se garanta completa segurança para o retorno das crianças, sendo substituídas por atividades lúdicas em casa e junto com os familiares. A atual pressão obstinada pelo retorno imediato à aulas presenciais por determinados grupos, visam apenas atender aos interesses de empresas da área educacional e também de donos de escolas particulares que colocam os lucros acima da vida dos alunos. Assistimos atualmente em pleno ápice da pandemia, a tentativa insana da imposição de uma normalidade impossível, e o funcionamento das escolas na forma presencial, assim como o retorno precoce das atividades esportivas, visam apenas a criação deste falso normal para a manutenção e continuidade da reprodução do capital, ao custo da saúde e da vida dos trabalhadores e dos filhos dos trabalhadores, caracterizando assim um verdadeiro extermínio de classe. Evidencia-se assim a urgência na superação deste atual modelo de mundo pautado na exploração, na exclusão, no individualismo e na destruição da natureza.

Referências

VYGOTSKY, L.S. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

ZANELLA, A.V.; ANDRADA, E.G.C. Processos de Significação no Brincar: Problematizando a constituição do sujeito. Psicologia em Estudo, Maringá, v.07, n.02, p.127-133, jul/dez. 2002.