Covid-19 não é uma
pandemia: a nova sindemia do século XXI
A covid-19 já não é apenas uma pandemia, mas já possui uma nova
classificação denominada de sindemia, e que não consiste apenas em uma mera mudança
terminológica. O termo SINDEMIA é um neologismo que deriva da junção das palavras
SINERGIA + PANDEMIA, e foi criada pelo antropólogo americano Merill Singer
ainda na década de 1990, onde, segundo ele:
Uma abordagem sindêmica fornece uma orientação muito
diferente para a medicina clínica e a saúde pública, mostrando como uma
abordagem integrada para entender e tratar doenças pode ser muito mais bem
sucedida do que simplesmente controlar doenças epidêmicas ou tratar pacientes
individuais (SINGER apud HORTON, 2020).
O conceito de sindemia lança um novo olhar sobre a covid-19, sendo o
contexto da doença e as interações com os aspectos sociais, fazem com que a covid-19
não seja considerada apenas como uma doença a nível biológico. Ao consideramos
a Covid-19 como uma relação biológica e social, fica mais fácil a compreensão
de sua dinâmica de contágios, também a tomada de decisões eficazes para
mitigação de novos surtos e melhora nos tratamentos. A covid-19 interage com inúmeras doenças pré-existentes,
tais como diabetes, cardiopatias, doenças respiratórias crônicas, doenças
renais, hipertensão, asma, câncer, aids e muitas outras, porém, essas interações ou combinações com a Covid-19, fazem potencializar os danos aos indivíduos com
tais comorbidades. Vale ressaltar ainda que em camadas mais pobres e em etnias
excluídas ou marginalizadas, os danos provocados pela sindemia da Covid-19
também são amplificados de forma exponencial e avassaladora. Fatores de risco para a Covid-19,
tais como a obesidade e diabetes são mais frequentes em populações mais pobres
e carentes, tais fatores tornam estas pessoas mais vulneráveis, favorecendo a
piora do estado de saúde destes indivíduos, que pertencem aos chamados grupos de
risco.
A vulnerabilidade dos cidadãos mais velhos;
Comunidades étnicas negras, asiáticas e minoritárias; e os trabalhadores-chave
que são comumente mal pagos com menos proteções de bem-estar apontam para uma
verdade até agora pouco reconhecida — ou seja, que não importa o quão eficaz um
tratamento ou proteção com uma vacina, a busca de uma solução puramente biomédica
para o COVID-19 falhará. A menos que os governos criem políticas e programas
para reverter profundas disparidades, nossas sociedades nunca serão
verdadeiramente seguras contra a covid-19. (HORTON, 2020)
Segundo Horton (2020), a
Covid-19 jamais será debelada apenas com a visão biomédica de restrições ou de
flexibilizações da mobilidade humana, novas vacinas ou medicamentos de última geração nunca serão
eficazes o suficiente e a busca de soluções exclusivamente biologicistas para a Covid-19
sempre fracassarão. Para este autor, é necessário ir muito além disso, para
ele, é urgente e necessário a superação da mera visão atual focada no limitado
conceito de pandemia, e começar a encarar a covid-19 como uma sindemia, sendo capaz de levar em conta as condições de trabalho, moradia, alimentação de
qualidade, saneamento, acesso ao lazer, assistência médica e renda dos trabalhadores
de todo o mundo e sem anular aquelas.
A crise econômica que se aproxima de nós não será
resolvida com um medicamento ou uma vacina.
Nada menos do que um avivamento nacional é necessário. Abordar a
Covid-19 como uma sindemia irá convidar a uma visão mais ampla, abrangendo
educação, emprego, moradia, alimentação e meio ambiente. Ver a Covid-19 apenas
como uma pandemia exclui esse processo mais amplo, mas necessário. (HORTON,
2020)
Portanto, faz-se necessário propor medidas para além das ações farmacológicas (vacinas, medicamentos) e não farmacológicas (uso de máscaras, distanciamento social, lockdown), estas que são fundamentais, porém, não suficientes para o controle da covid-19 no mundo.
No Brasil, por exemplo, enquanto avança o programa de
vacinação da população brasileira (29% da população adulta imunizada até o momento) com uma
média de 2 milhões de doses aplicadas diariamente, vemos em paralelo a aniquilação
de direitos trabalhistas pelo congresso, a votação de leis contra os direitos
indígenas, e também o aumento de queimadas e desmatamentos na Amazônia, no
Cerrado e Pantanal, considerados os principais biomas do planeta Terra. Sendo
assim, mais distante se torna o controle da covid-19 e a diminuição de
contágios. Não apenas isso, estamos abrindo as portas para o surgimento de
novas epidemias e endemias com a destruição rapace da natureza e o aumento das
desigualdades sociais. Tais mazelas, desigualdades e injustiças sociais são consequências claras do
insaciável e destrutível movimento capitalista sobre a natureza e sobre a vida humana.
Quando e como fazer exercícios após o contágio por Covid19 ?
No dia 30 de janeiro de 2020, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou Estado de Emergência Global em
virtude da proliferação do novo coronavírus a partir de surtos localizados
primeiramente na cidade de Wuhan, na China. Os contágios se espalharam para
além das fronteiras chinesas, e vários países do mundo passaram a ter surtos da
doença transmitida pelo novo coronavírus. Mas somente no dia 11 de março de
2020 e de forma tardia, é que a OMS decreta para o mundo o alerta de Pandemia
do novo coronavírus diante do fracasso das políticas de mitigação de contágios
adotadas pelos países afetados. A partir daí, a humanidade passa a enfrentar
uma doença altamente letal e completamente desconhecida. Cada descoberta pela
ciência sobre a Covid-19 tem se tornado em importante passo para desvendar os
mistérios e descobrir a dinâmica da ação do vírus no corpo humano. Não se sabe
ao certo os efeitos e as consequências do vírus no corpo humano a longo prazo,
já que a doença é muito recente, porém, as observações em pacientes que
receberam alta dos hospitais, tem indicado sequelas importantes em decorrência
da covid-19. Existem ainda muitas dúvidas sobre a influência dos exercícios
físicos em pacientes já recuperados da Covid-19, mas muita coisa tem sido
descoberta pela ciência neste curto espaço de tempo de pandemia sobre o tema
relacionado a exercícios físicos e a covid-19.
No início da pandemia do novo
coronavírus, durante o primeiro semestre de 2020, se sabia muito pouco sobre as
manifestações e as sequelas da Covid-19, porém, várias das perguntas foram
sendo respondidas após intensas pesquisas e também através das experiências
acumuladas no tratamento de pacientes infectados nestes mais de um ano de
pandemia. Sabe-se atualmente que a Covid-19 não é somente uma doença pulmonar,
ela é capaz de provocar a chamada “tempestade inflamatória” no corpo dos
pacientes, atingindo praticamente todos os órgãos e tecidos do corpo humano. A
Covid-19 é na verdade uma doença sistêmica, capaz de atacar ao mesmo tempo todos
os órgãos humanos, desde os pulmões, passando pelo coração, cérebro, pele,
olhos, sistema nervoso, rins, sistema circulatório e etc, provocando
dificuldades respiratórias, fibroses pulmonares, fraquezas, confusões mentais,
perda da libido, tromboses e AVC.
Figura 01 -
"Tempestade Inflamatória" provocada pela Covid-19
Um dos órgãos que mais sofre com os
ataques do vírus Sars-Cov-2, além dos pulmões, é o coração. O vírus ataca os
músculos cardíacos podendo provocar sérias lesões miocárdicas (miocardite),
arritmias, palpitações, paradas cardíacas e até mortes súbitas em esportistas e
em atletas. Todo o sistema circulatório também sofre influência do vírus com
surgimento de coagulações sanguíneas (tromboses). Segundo estudos publicados
pela Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE) em
conjunto com a Sociedade Brasileira de Cardiologia (2020), mesmo pessoas que
apresentaram quadros leves da doença, podem apresentar sérias alterações
eletrocardigráficas mesmo setenta (70) dias após o diagnóstico da doença. A
Covid-19, segundo o estudo apresentado, tem provocado complicações
cardiovasculares em cerca de 16% dos pacientes, lesões cardíacas em 20-30% dos
pacientes hospitalizados e contribuindo para 40% dos óbitos. Para aqueles
indivíduos que durante a fase aguda da doença apresentaram miocardite e que já
receberam alta, a recomendação médica é três meses de espera antes do retorno
aos exercícios físicos ou treinamento, e a realização de exames médicos
detalhados (APP) neste período considerado.
Sabe-se que durante a pandemia e as
regras de isolamento social, muitas pessoas passaram a cultivar uma vida
sedentária e com considerável aumento da obesidade. Além disso, agravaram-se
entre as populações de vários países problemas relacionados ao estresse,
depressão e distúrbios mentais de variadas ordens. Sabe-se também da
importância das práticas de exercícios físicos de forma contínua e regular como
instrumento eficaz no auxílio do combate ao estresse, do sedentarismo e da
obesidade. Os exercícios físicos podem auxiliar na construção de uma qualidade
de vida melhor para a população em tempos de pandemia e até ajudar no
equilíbrio do sistema imunológico, desde que sejam respeitadas as regras de
distanciamento social, utilização de máscaras e a lavagem das mãos.
Recomenda-se ainda a prática de exercícios físicos em locais abertos, ao ar
livre e sem aglomerações de pessoas. Todavia, devido às sequelas graves
provocadas pela covid-19 em pacientes já recuperados, a prescrição de
exercícios físicos e de treinos, tem trazido grande preocupação e cautela entre
os professores de educação física e os médicos, justamente para aquelas pessoas
que já receberam alta, mesmo para os que apresentaram casos leves da doença. As
atividades aeróbicas, como a prática da natação, por exemplo, não são
recomendadas para pessoas que já tiveram a Covid-19, principalmente devido aos
problemas correlacionados às inflamações do miocárdio que afetam grande parte
destes pacientes. A sugestão é a realização de exames detalhados do coração e
aguardar por cerca de três (3) meses, com acompanhamento médico, o retorno
efetivo dos exercícios físicos (aeróbicos), incluso aqui a natação. Abaixo os
fluxogramas para o retorno das atividades aeróbicas para pacientes que
receberam alta da covid-19. No primeiro fluxograma o algoritmo a ser seguido
para aqueles esportistas de práticas recreativas e no segundo gráfico o
algoritmo para atletas de alto rendimento no período pós alta de covid-19.
Figura 02 - Fluxograma para retorno de exercicios físicos em esportistas de recreação após a alta da covid-19.
Figura 03 - Fluxograma para retorno de exercícios físicos
em atletas de alto rendimento após a alta de covid-19.
Referências
HORTON, R. OFFLINE: COVID-19 is not a pandemic. The Lancet, v.396, p874, september 26, 2020.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Disponível em: <https://www.portal.cardiol.br/post/posicionamento-sobre-avaliacao-pre-participacao-cardiologica-apos-a-covid-19>.
Acesso em: 25/11/2020.