quarta-feira, 25 de agosto de 2021

OFFLINE: A Sindemia de Covid-19 e a Educação Física


 Praça das Mães - Av. Anhanguera em Goiânia


(Escrito por Renato Coelho)


Covid-19 não é uma pandemia: a nova sindemia do século XXI

  

A covid-19 já não é apenas uma pandemia, mas já possui uma nova classificação denominada de sindemia, e que não consiste apenas em uma mera mudança terminológica. O termo SINDEMIA é um neologismo que deriva da junção das palavras SINERGIA + PANDEMIA, e foi criada pelo antropólogo americano Merill Singer ainda na década de 1990, onde, segundo ele:

 

Uma abordagem sindêmica fornece uma orientação muito diferente para a medicina clínica e a saúde pública, mostrando como uma abordagem integrada para entender e tratar doenças pode ser muito mais bem sucedida do que simplesmente controlar doenças epidêmicas ou tratar pacientes individuais (SINGER apud HORTON, 2020).

 

 

O conceito de sindemia lança um novo olhar sobre a covid-19, sendo o contexto da doença e as interações com os aspectos sociais, fazem com que a covid-19 não seja considerada apenas como uma doença a nível biológico. Ao consideramos a Covid-19 como uma relação biológica e social, fica mais fácil a compreensão de sua dinâmica de contágios, também a tomada de decisões eficazes para mitigação de novos surtos e melhora nos tratamentos. A covid-19 interage com inúmeras doenças pré-existentes, tais como diabetes, cardiopatias, doenças respiratórias crônicas, doenças renais, hipertensão, asma, câncer, aids e muitas outras, porém, essas interações ou combinações com a Covid-19, fazem potencializar os danos aos indivíduos com tais comorbidades. Vale ressaltar ainda que em camadas mais pobres e em etnias excluídas ou marginalizadas, os danos provocados pela sindemia da Covid-19 também são amplificados de forma exponencial e avassaladora. Fatores de risco para a Covid-19, tais como a obesidade e diabetes são mais frequentes em populações mais pobres e carentes, tais fatores tornam estas pessoas mais vulneráveis, favorecendo a piora do estado de saúde destes indivíduos, que pertencem aos chamados grupos de risco.

 

A vulnerabilidade dos cidadãos mais velhos; Comunidades étnicas negras, asiáticas e minoritárias; e os trabalhadores-chave que são comumente mal pagos com menos proteções de bem-estar apontam para uma verdade até agora pouco reconhecida — ou seja, que não importa o quão eficaz um tratamento ou proteção com uma vacina, a busca de uma solução puramente biomédica para o COVID-19 falhará. A menos que os governos criem políticas e programas para reverter profundas disparidades, nossas sociedades nunca serão verdadeiramente seguras contra a covid-19. (HORTON, 2020)

 

 


Segundo Horton (2020), a Covid-19 jamais será debelada apenas com a visão biomédica de restrições ou de flexibilizações da mobilidade humana, novas vacinas ou medicamentos de última geração nunca serão eficazes o suficiente e a busca de soluções exclusivamente biologicistas para a Covid-19 sempre fracassarão. Para este autor, é necessário ir muito além disso, para ele, é urgente e necessário a superação da mera visão atual focada no limitado conceito de pandemia, e começar a encarar a covid-19 como uma sindemia, sendo capaz de levar em conta as condições de trabalho, moradia, alimentação de qualidade, saneamento, acesso ao lazer, assistência médica e renda dos trabalhadores de todo o mundo e sem anular aquelas.

 

A crise econômica que se aproxima de nós não será resolvida com um medicamento ou uma vacina.  Nada menos do que um avivamento nacional é necessário. Abordar a Covid-19 como uma sindemia irá convidar a uma visão mais ampla, abrangendo educação, emprego, moradia, alimentação e meio ambiente. Ver a Covid-19 apenas como uma pandemia exclui esse processo mais amplo, mas necessário. (HORTON, 2020)

 

 

Portanto, faz-se necessário propor medidas para além das ações farmacológicas (vacinas, medicamentos) e não farmacológicas (uso de máscaras, distanciamento social, lockdown), estas que são fundamentais, porém, não suficientes para o controle da covid-19 no mundo. 

No Brasil, por exemplo, enquanto avança o programa de vacinação da população brasileira (29% da população adulta imunizada até o momento) com uma média de 2 milhões de doses aplicadas diariamente, vemos em paralelo a aniquilação de direitos trabalhistas pelo congresso, a votação de leis contra os direitos indígenas, e também o aumento de queimadas e desmatamentos na Amazônia, no Cerrado e Pantanal, considerados os principais biomas do planeta Terra. Sendo assim, mais distante se torna o controle da covid-19 e a diminuição de contágios. Não apenas isso, estamos abrindo as portas para o surgimento de novas epidemias e endemias com a destruição rapace da natureza e o aumento das desigualdades sociais. Tais mazelas, desigualdades e injustiças sociais são consequências claras do insaciável e destrutível movimento capitalista sobre a natureza e sobre a vida humana.


Quando e como fazer exercícios após o contágio por Covid19 ?

No dia 30 de janeiro de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou Estado de Emergência Global em virtude da proliferação do novo coronavírus a partir de surtos localizados primeiramente na cidade de Wuhan, na China. Os contágios se espalharam para além das fronteiras chinesas, e vários países do mundo passaram a ter surtos da doença transmitida pelo novo coronavírus. Mas somente no dia 11 de março de 2020 e de forma tardia, é que a OMS decreta para o mundo o alerta de Pandemia do novo coronavírus diante do fracasso das políticas de mitigação de contágios adotadas pelos países afetados. A partir daí, a humanidade passa a enfrentar uma doença altamente letal e completamente desconhecida. Cada descoberta pela ciência sobre a Covid-19 tem se tornado em importante passo para desvendar os mistérios e descobrir a dinâmica da ação do vírus no corpo humano. Não se sabe ao certo os efeitos e as consequências do vírus no corpo humano a longo prazo, já que a doença é muito recente, porém, as observações em pacientes que receberam alta dos hospitais, tem indicado sequelas importantes em decorrência da covid-19. Existem ainda muitas dúvidas sobre a influência dos exercícios físicos em pacientes já recuperados da Covid-19, mas muita coisa tem sido descoberta pela ciência neste curto espaço de tempo de pandemia sobre o tema relacionado a exercícios físicos e a covid-19.

No início da pandemia do novo coronavírus, durante o primeiro semestre de 2020, se sabia muito pouco sobre as manifestações e as sequelas da Covid-19, porém, várias das perguntas foram sendo respondidas após intensas pesquisas e também através das experiências acumuladas no tratamento de pacientes infectados nestes mais de um ano de pandemia. Sabe-se atualmente que a Covid-19 não é somente uma doença pulmonar, ela é capaz de provocar a chamada “tempestade inflamatória” no corpo dos pacientes, atingindo praticamente todos os órgãos e tecidos do corpo humano. A Covid-19 é na verdade uma doença sistêmica, capaz de atacar ao mesmo tempo todos os órgãos humanos, desde os pulmões, passando pelo coração, cérebro, pele, olhos, sistema nervoso, rins, sistema circulatório e etc, provocando dificuldades respiratórias, fibroses pulmonares, fraquezas, confusões mentais, perda da libido, tromboses e AVC.


 

 

 

Figura 01 - "Tempestade Inflamatória" provocada pela Covid-19

 

Um dos órgãos que mais sofre com os ataques do vírus Sars-Cov-2, além dos pulmões, é o coração. O vírus ataca os músculos cardíacos podendo provocar sérias lesões miocárdicas (miocardite), arritmias, palpitações, paradas cardíacas e até mortes súbitas em esportistas e em atletas. Todo o sistema circulatório também sofre influência do vírus com surgimento de coagulações sanguíneas (tromboses). Segundo estudos publicados pela Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE) em conjunto com a Sociedade Brasileira de Cardiologia (2020), mesmo pessoas que apresentaram quadros leves da doença, podem apresentar sérias alterações eletrocardigráficas mesmo setenta (70) dias após o diagnóstico da doença. A Covid-19, segundo o estudo apresentado, tem provocado complicações cardiovasculares em cerca de 16% dos pacientes, lesões cardíacas em 20-30% dos pacientes hospitalizados e contribuindo para 40% dos óbitos. Para aqueles indivíduos que durante a fase aguda da doença apresentaram miocardite e que já receberam alta, a recomendação médica é três meses de espera antes do retorno aos exercícios físicos ou treinamento, e a realização de exames médicos detalhados (APP) neste período considerado.

Sabe-se que durante a pandemia e as regras de isolamento social, muitas pessoas passaram a cultivar uma vida sedentária e com considerável aumento da obesidade. Além disso, agravaram-se entre as populações de vários países problemas relacionados ao estresse, depressão e distúrbios mentais de variadas ordens. Sabe-se também da importância das práticas de exercícios físicos de forma contínua e regular como instrumento eficaz no auxílio do combate ao estresse, do sedentarismo e da obesidade. Os exercícios físicos podem auxiliar na construção de uma qualidade de vida melhor para a população em tempos de pandemia e até ajudar no equilíbrio do sistema imunológico, desde que sejam respeitadas as regras de distanciamento social, utilização de máscaras e a lavagem das mãos. Recomenda-se ainda a prática de exercícios físicos em locais abertos, ao ar livre e sem aglomerações de pessoas. Todavia, devido às sequelas graves provocadas pela covid-19 em pacientes já recuperados, a prescrição de exercícios físicos e de treinos, tem trazido grande preocupação e cautela entre os professores de educação física e os médicos, justamente para aquelas pessoas que já receberam alta, mesmo para os que apresentaram casos leves da doença. As atividades aeróbicas, como a prática da natação, por exemplo, não são recomendadas para pessoas que já tiveram a Covid-19, principalmente devido aos problemas correlacionados às inflamações do miocárdio que afetam grande parte destes pacientes. A sugestão é a realização de exames detalhados do coração e aguardar por cerca de três (3) meses, com acompanhamento médico, o retorno efetivo dos exercícios físicos (aeróbicos), incluso aqui a natação. Abaixo os fluxogramas para o retorno das atividades aeróbicas para pacientes que receberam alta da covid-19. No primeiro fluxograma o algoritmo a ser seguido para aqueles esportistas de práticas recreativas e no segundo gráfico o algoritmo para atletas de alto rendimento no período pós alta de covid-19.

 

 Figura 02 - Fluxograma para retorno de exercicios físicos em esportistas de recreação após a alta da covid-19.






                         


 Figura 03 - Fluxograma para retorno de exercícios  físicos em  atletas de alto rendimento após a alta de covid-19.








Referências


 HORTON, R. OFFLINE: COVID-19 is not a pandemic. The Lancet, v.396, p874, september 26, 2020.


SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Disponível em: <https://www.portal.cardiol.br/post/posicionamento-sobre-avaliacao-pre-participacao-cardiologica-apos-a-covid-19>. Acesso em: 25/11/2020.