(Escrito por: Renato Coelho)
Quando se devem iniciar as
aulas ou treinamentos de natação para grupos de alunos iniciantes ou de
nadadores de alto rendimento durante a pandemia do novo coronavírus? Uma turma
de natação pode criar um ambiente favorável de transmissão do novo coronavírus (“super-spreader”)?
Medição de temperatura na entrada, álcool em gel nas mãos, tapetes
sanitizadores, máscaras, protetores faciais em acrílico, ambientes abertos e
todos os demais protocolos de biossegurança criados são realmente seguros e
eficazes? As repostas a essas perguntas estarão sempre relacionadas à dinâmica
de crescimento da pandemia, ou seja, de acordo com a mensuração e controle das
taxas de contágios do novo coronavírus numa dada cidade ou região. Quando os
índices de contágios pelo novo coronavírus estão em fase ascendente (crescente),
significa que a pandemia está fora de controle e portanto não deve haver aulas
com grupos ou turmas de natação, seja em ambientes abertos ou fechados. Não importa
o quanto sejam rígidos os protocolos de biossegurança ou as normas de proteção,
os participantes das aulas sempre estarão sobre risco iminente de contágio
quando a pandemia estiver fora de controle, ou seja, na sua fase ascendente.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) (https://www.who.int/eportuguese/publications/pt/), existem seis critérios em que países, estados e municípios devem observar antes de flexibilizarem as regras de isolamento social e assim estabelecer cronogramas para a abertura de atividades tais como: comércio, indústria e instituições educacionais, incluso aqui também as aulas em escolas de natação. São critérios científicos e adotados por diversos países, que diferentemente do Brasil, conseguiram controlar a pandemia do novo coronavírus no primeiro semestre de 2020. Somente estes critérios são capazes de definir com exatidão e segurança qual o momento exato para se permitir a abertura e flexibilização para as diversas atividades humanas na área da economia, lazer, entretenimento, esporte e educação. Sabemos que atualmente uma voraz e rápida segunda onda de contágios avança sobre países de diversas regiões do planeta, que não tomaram as medidas corretas no seu devido tempo, e os índices de contágios e de óbitos voltaram a subir de forma drástica e descontrolada nestas mesmas regiões, provando que o vírus é mais perigoso do que se imaginava.
Vamos então aos critérios
da OMS que podem nortear a abertura de escolas e também de turmas de natação:
O primeiro critério,
segundo a OMS, diz que a cidade ou região deve possuir um sistema de saúde
capaz de identificar, testar, isolar, rastrear todos os contatos e tratar as
pessoas infectadas. A testagem em massa é fundamental para o efetivo controle
da pandemia. Faz-se a testagem de toda a população, em seguida isolam os
positivados, depois faz-se o rastreamento de todos as pessoas que tiveram
contatos recentes com essas mesmas pessoas contaminadas. O segundo critério
é a garantia de que os locais de trabalho e os demais ambientes frequentados por todas as pessoas sejam
locais seguros contra os contágios, ou
seja, arejados, sem aglomerações e com disponibilidade de equipamentos de segurança
individual (EPI). O terceiro critério diz respeito a adoção de
barreiras sanitárias para atender os casos de pessoas já contaminadas e cuja
origem seja de fora da cidade ou do país (casos importados), seja em
aeroportos, rodovias, portos ou entradas das cidades. O quarto critério
é o controle de eventuais surtos em locais estratégicos como hospitais e casas
de repouso, para se evitar o aumento na taxa de crescimento da pandemia. O quinto
critério é a adoção de medidas preventivas para a conscientização da
população com relação à pandemia e suas formas de contágio. O sexto e último
critério sugere que a reabertura e flexibilização das atividades
econômicas, sociais e culturais devem
ocorrer somente quando as taxas de contágios estiverem em queda, ou seja,
somente quando a pandemia estiver sob controle.
Uma regra importante e que
não foi listada pela OMS é a adoção de políticas econômicas robustas de fomento
para as empresas e para todos os trabalhadores de atividades não essenciais que
foram obrigados a participar do isolamento social.
Assim sendo, vemos que em Goiás e em Goiânia, os governos não adotaram e continuam não adotando de forma integrada nenhuma dessas seis medidas de prevenção e de controle da pandemia. O que presenciamos são flexibilizações precoces e aligeiradas que são as grandes responsáveis pelo número exagerado de mortes, onde os professores de Educação Física e todos os demais trabalhadores em geral acabam por arriscarem as suas próprias vidas para a manutenção diária de suas necessidades materiais e financeiras, simplesmente porque não existe nenhuma ação coordenada para a promoção do controle da pandemia por parte dos governos (Municipais, Estaduais e Federal).
O crescimento e a velocidade de epidemias obedecem às chamadas curvas exponenciais, onde a velocidade do surgimento de novos casos estará sempre relacionada ao número de casos pré-existentes, crescendo vertiginosamente numa progressão geométrica, podendo dobrar em semanas ou dias a quantidade total de novos casos e de óbitos a depender de sua dinâmica. A forma e a trajetória desta curva se relaciona a vários fatores, como o nível de isolamento populacional, o uso de protocolos de saúde, como por exemplo, o uso obrigatório de máscaras em locais públicos, a existência ou não de vacinas, da quantidade de pessoas imunes e também às características do próprio vírus.
O
chamado coeficiente de transmissão (Rt) mede a velocidade de transmissão do
vírus, ou seja, ele é capaz de nos informar se a pandemia em determinada região
ou país está em processo de aceleração ou de desaceleração. A Grosso modo, o
coeficiente de transmissão Rt da pandemia mede a inclinação da curva
exponencial, ou seja, se a curva é crescente, significa que há aumento na taxa
de transmissão, então Rt > 1, e
consequentemente haverá aumento de casos de novos contágios (ver Figura 01
acima). Caso a curva seja decrescente Rt < 1, significa que a pandemia está em desaceleração, logo haverá diminuição na taxa de novos contágios. Portanto, sendo
Rt > 1 a pandemia está em estágio de crescimento acelerado, e sendo Rt <
1, significa que a pandemia está em processo de desaceleração. Por exemplo, o
Brasil hoje, no atual estágio da pandemia apresenta hoje Rt = 1,21 e significa que
cada grupo de 100 pessoas é capaz de contaminar outras 121 pessoas (aumento
da transmissão). Em outubro o valor Rt no Brasil chegou ao valor de 0,68 e significava que
um grupo de 100 pessoas era capaz de contaminar outras 68 pessoas (transmissão
em desaceleração). Então, seguindo as normas e observações das taxas de
crescimento da pandemia, os períodos recomendados para funcionamento de aulas
de natação devem seguir não somente os protocolos de biossegurança recomendados
(máscaras, álcool em gel, protetor facial, distanciamento social), mas também a
observância da taxa de crescimento da pandemia (Rt) e sem o acompanhamento
diário de Rt, a utilização de equipamentos de biossegurança se torna ineficaz. Quando Rt > 1, as aulas devem ser automaticamente suspensas (ver
gráfico 02 abaixo).
Na Figura 02 acima, no período de 0 até A, vemos que a curva é crescente e o valor de Rt>1, logo não se recomenda a prática de aulas em escolas de natação ou em academias. De A até B a curva cresce e continua com Rt>1. Já de B até C a curva apresenta uma acentuada desaceleração Rt<1, porém o número de novos contágios apresenta uma média alta (acima de M), e por isso também não se recomenda a prática de aulas coletivas de natação, seja em escolas ou academias. Na trajetória de C a D na curva observarmos uma desaceleração dos contágios Rt<1 e uma média inferior a M, tornando segura a abertura de escolas e academias de natação, desde que utilize todos os protocolos de biossegurança (máscara, álcool gel, etc.) e o distanciamento social.
Quando
se promove o isolamento social é justamente para tentar frear a curva
exponencial e achatá-la, ou seja, de permitir que o sistema de saúde local
tenha condições de atender à grande demanda exigida pela pandemia, sem permitir
com que o sistema de saúde entre em colapso. Entretanto, o que assistimos no
Brasil, durante o ano de 2020, foi que nenhum governo municipal, estadual e
muito menos o governo federal conseguiu achatar a curva e evitar o colapso do
sistema de saúde nas diferentes regiões do país. As curvas atingiram o pico
abruptamente e de forma avassaladora nas regiões Norte, Sul, Centro-Oeste,
Nordeste e Sudeste do Brasil sem exceção, e hoje enfrentamos uma segunda onda de contágios.
Nunca
houve no Brasil quarentena verdadeira, as constantes e apressadas
flexibilizações do comércio, a forte pressão do governo Federal para o fim do
isolamento social adotado por governadores e ainda a falta de remuneração
salarial por parte do Estado para as pessoas realmente se manterem em casa durante
a pandemia, fizeram fracassar qualquer tipo de planejamento ou estratégia de isolamento social no país.
Não é possível para as famílias de trabalhadores se manterem afastadas do trabalho e em casa
sem uma remuneração salarial por parte do Estado. O chamado auxílio
emergencial, além de ter sido tardio, com um valor inicial e irrisório de apenas 600 reais, que hoje foi
reduzido para a metade (300 reais), tornou inviável qualquer forma de
quarentena ou de isolamento social eficaz para a maioria dos trabalhadores e de desempregados
do Brasil. Era dever do Estado financiar e garantir a quarentena da população brasileira com
remuneração salarial digna (valor maior ou igual a 01 salário mínimo) para
todos os trabalhadores brasileiros que foram obrigados a ficarem em casa
durante a quarentena. Tal medida não somente permitiria a realização da
quarentena por milhões de brasileiros, assim como também garantiria a
manutenção dos empregos a curto e médio prazo.
O que
assistimos atualmente no Brasil é o vírus totalmente fora de controle e a
promoção por parte do Estado de um verdadeiro extermínio de classe, onde
milhares de trabalhadores pobres e desempregados morrem cotidianamente no país.
Se antes da pandemia os números da miséria e do desemprego já eram altos,
promovendo uma vida anormal, esses números aumentaram ainda mais durante o ano
de 2020. A pandemia ajuda a desnudar e também potencializar as injustiças e
mazelas do Brasil e do mundo.